Pois
é, às 7h da manhã de 18-5-15, a Ipanema FM 94,9 “morreu”, sendo substituída
pela rádio Band AM de Porto Alegre; uma lástima, para muitos - será, agora,
somente uma web rádio. Para mim e outras pessoas, um fim há muito tempo
aguardado. Lamentações no facebook e em sites locais de notícias não faltaram;
compreendo a “dor” (se é que esse é o conceito correto) pelo fim de uma
entidade tão importante na cultura de Porto Alegre durante a década de 1990,
mas a velha Ipanema já estava em “ponto morto” e “ladeira abaixo” em termos de
relevância há mais de uma década.
Comecei a ouvir a programação da
emissora em janeiro de 90, perdeu-se na memória se alguém me indicou a emissora
ou sintonizei por acaso no dial do aparelho, o que certamente tenha sido o mais
provável, e claro que me chamaram a atenção àquelas canções tão diferentes de
artistas e grupos que não eram executadas na também extinta Universal FM.
Demorou um pouco para me adaptar àquela pauta musical e àqueles locutores que
falavam como se estivessem em uma mesa em algum bar no Bonfim; não que eles me
parecessem mais inteligentes ou mais ousados que os de outras emissoras, mas
eles tocavam músicas e abordavam assuntos que outros não queriam ou podiam
mencionar, e isso era um diferencial para mim e tantos outros ouvintes.
Kátia Suman, Nara Sarmento e Mary
Mesari (espero ter digitado teu sobrenome corretamente) são as vozes de rádio
“oficiais” da minha adolescência, qualquer novo grupo ou músico que elas
afirmavam ser bom, obviamente era bom, a gente confiava no que elas diziam; já
o “alemão” Vitor Hugo não era alguém que eu costumasse ouvir seu horário, mesmo
porque nesse período eu ia ao colégio durante a manhã, e tinhas as tardes e
noites disponíveis para escutar a rádio. E outra locutor de rádio de rock que
quer falar sobre seu time de futebol (sou torcedor do Internacional, assim como
o Vitor Hugo fanfarrão) que vá trabalhar em rádio de esportes!
Não me reservo à nostalgia que
muitos “ipanêmicos” expressam pela desativação da emissora, só que é preciso
entender que qualquer contexto que tenha tido um auge, invariavelmente terá um
fim se não se renovar, se não se atualizar. E é isso exatamente isso que houve
com a 94.9; desde o momento em que me tornei ouvinte da rádio até o corrente
mês de maio de 2015, senão o mundo, ao menos a sociedade local mudou bastante,
e a tecnologia em geral avançou de um modo impressionante. Lembro-me de um
programa que era transmitido, se não estou enganado às terças-feiras às 23
horas (ou era às 0h de quarta para quinta-feira?), chamado “A Hora do Demo”,
para o qual as bandas iniciantes da capital do Rio Grande do Sul e cidades
vizinhas enviavam suas fitas demo, a fim de que fossem veiculadas naquela uma
hora de programa. Afora esse único espaço na grande mídia para quem não tinha
ainda um contrato com qualquer gravadora, por menor que fosse a única
alternativa era tocar, por exemplo, no também defunto Garagem Hermética para
meia dúzia de pessoas, sem qualquer garantia de futuro nessa empreitada árdua
que é uma carreira musical.
O avanço tecnológico da década de
1990, que abarca a chegada da internet no país, o que inclui o acesso a sites
sobre música (em língua portuguesa, em inglês, em francês), de compartilhamento
de arquivos em mp3 e depois, com o surgimento do Youtube, transformaram
radicalmente a forma com que as pessoas conhecem música e o modo com artistas
iniciantes divulgam suas gravações (sendo que atualmente, com o equipamento
adequado, pode se gravar quantas músicas se desejar e “jogá-las” na internet),
somado ao encerramento de atividades de vários artistas e bandas que
despontaram com a onda do rock gaúcho na década anterior, são os fatores
cruciais para a “puxada de tapete” da Ipanema como a emissora que executava aquela
“pauta musical” que não cabia nem na Universal FM nem na rádio Atlântida, e
isso foi fatal para a emissora, que ao deixar de ser a “definidora de gostos
musicais e culturais não-mainstream”, começou a se perder no finalzinho do
século XX.
Afirmo isso, pois ali por 1999,
2000, nos domingos à noite passou a ser um veiculado um programa apresentado
por uma modelo e um DJ (não me lembro de seus nomes, providencialmente), que se
não me engano trocavam algumas figurinhas sobre moda e comportamento, sendo que
o tipo de música executado era hip-hop, uma orientação bem diferente do que
estávamos até então acostumados, e nos anos seguintes, a emissora parecia mais
haver se tornado uma rádio de rap do que qualquer outra coisa, e esse foi o
momento em que “abandonei o barco”. Em 2006, tentei voltar a escutar a
programação, só que ali naquele momento, parecia que a Ipanema havia se tornado
uma rádio de reggae, e outra vez desisti de ouvi-la. Isso sem contar as
transmissões de partidas de futebol, em forma de rede com a Band AM 640 (2011 -
2014), o que espantava muitos ouvintes nos finais de semana.
De 2013 para cá, pareceu haver um
ensaio de renascimento, só que não muito crível o que ficou claro com o
surgimento de um programa chamado “A La Minuta”, um espaço para debates os mais
variados entre 12h e 13h; difícil engolir as opiniões de “gênios” tais quais
Cagê Lisboa, Ico Thomaz, Fabiano Baldasso e Tadeu Malta (todos ex-funcionários
da RBS, curioso) e, como se não bastasse, daquelas menininhas locutoras, como a
Juli Baldi, que se acham donas da verdade e que querem todos engulam as
opiniões delas sobre o modo de viver das pessoas - neste momento, ocorreu a,
digamos, “morte cerebral” da emissora! Uma tentativa vã de ter recuperar a
relevância midiática e cultural de duas décadas antes, com um mudança de perfil
(e um certo ranço reacionário) que não convencia: a Ipanema de janeiro de 90
tinha a cara do quarteirão que fica no início da Avenida Osvaldo Aranha, de
frente para o Campus Centro da UFRGS, contestadora, levemente esquerdista e
pluralista; a Ipanema “renascida” de 2014 tem a cara da Cidade Baixa, festeira
(com um ranço de estar alcoolizada exagerada e imprudentemente), pensando que
sabe de tudo, mal disfarçadamente direitista, cheia de si e com muito pouco a
dizer. Desse jeito, não teria como continuar, mesmo.
O anúncio do fim da emissora pegou
muita gente de surpresa, mesmo a mim, quando o Cagê Lisboa postou em seu perfil
no facebook que tinha sido demitido (isso foi na segunda dia 11/5); antes, o
Blog do Prévidi em post extraordinário ao meio-dia do domingo 10/5 anunciava a
mudança, que é compreensível até, dado que a Band RS era a única emissora a
transmitir notícias e futebol que ainda não tinha frequência em FM (sendo que
as rádios Gaúcha, Guaíba e Grenal as têm já há alguns anos, e pela Bandnews
Porto Alegre é possível transmitir apenas uma partida em cada rodada) e,
convenhamos, jornalistas veteranos tais como Luiz Carlos Reche, André Machado,
Diego Casagrande e José Aldo Pinheiro não se transferiram para a Rede
Bandeirantes para serem ouvidos por quase ninguém.
Quem se manifestou na internet
contra o fim da emissora, lamentou no mais das vezes a extinção da mesma,
outros a citaram como fator fundamental em sua “educação cultural”, sendo que
alguns apontaram que essa situação seria uma ação da Rede Bandeirantes no
sentido de “destruir a cultura de Porto Alegre”, como se a Ipanema FM 94.9
fosse realmente uma “estrutura alternativa”: pensem bem, uma “estrutura
alternativa” teria 32 anos de existência dentro de uma empresa capitalista, se
essa cultura que diziam que a rádio propagava não fosse algo “comercialmente
vendável”? Aí não seria uma emissora comercial, e sim nos moldes da FM Cultura
103,3 de Porto Alegre (pertencente ao governo do RS) ou a Rádio da Universidade
Federal do RS, essas duas sim veiculam música e cultura bem menos “vendáveis”
que rock and roll, hip-hop e reggae, pauta costumeira da Ipanema nesses últimos
16 anos - sim, foram dezesseis anos de desorientação e de uma “agonia” patética
e ridícula! Curioso, que nessa semana derradeira, sem os locutores, a Ipanema
tocou mais rock and roll do que vinha fazendo até então.
Para preencher esse espaço, há a
Unisinos FM 103.3, que é uma emissora quase razoável e que não tenta ser nem a
“velha” nem a “nova” Ipanema, apesar de veicularem umas músicas indie muito
chatas em sua programação, e que até partidas de futebol transmite (com uma
equipe de esportes que fala de Real Madrid e Barcelona em seus programas, felizmente!).
Fica a saudade para todos nós que
ouvimos a Rádio Ipanema FM 94.9 em algum período de nossas vidas,
preferencialmente em seus melhores tempos, a revolta e lamentação daqueles que
não queriam a desativação da mesma e transformação em web rádio, só que veículo
de comunicação não dura muito tempo se não se renovar.
RESMUINDO: NADA NA VIDA É ETERNO, E
NÃO SERIA UMA EMISSORA DE RÁDIO FM QUE TERIA ESSA CONDIÇÃO, NÃO É MESMO?
2 comentários:
Não é que tudo na vida tem um fim. Ok, tem. Mas também as coisas mudam, evoluem, se não, acabam mesmo. Prova disso o fim da boa (e da ruim) Ipanema FM.
Eu também adorava escutar a Kátia, a Mery, entre tantos outros que eram (e creio ainda serem) gente boa pra caramba. Bons porque, creio eu, são, além de jornalistas, pessoas informadas e que debochavam do ego alheio.
Eu curtia também a irreverência do Zé do Belo, lembra? Meu programa de sábado ao meio-dia, companhia do chimarrão enquanto fazia o almoço, era a “Cena de Cinema” com Renato Martins, que foi o último restante da velha (e boa) guarda da saudosa Ipanema FM.
Depois eu concordo contigo que a galera degringolou. A rádio deixou a qualidade, rendendo-se aos jabás tão criticados nos anos 2000 até 2010 – anos que a minha memória recorda os bons tempos desta rádio.
E tu vê, hoje o Cagê está na União FM com o programa “Happy Hour”, onde toca o bom rock in roll, com clássicos e novidades, além de informação musical e agenda cultural da região.
Mas, saudosa que sou, confesso que ouvir “ Bad to the bone” me transmite lá praquela época... ôo saudade! ;)
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